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Saltos sem altos

Saltos sem altos

O dia em que conheci Miguel Esteves Cardoso

27.06.19, Ana sem saltos

Nem de propósito, aqui a valentona a falar ontem de medos, e sou posta à prova no próprio dia. 

Depois de um dia de outono enfiado dentro de junho, aqui, na minha terra, onde o tempo é desobediente e ignora vontades e estações, pôs-se um fim de dia com cheiro a agosto.

Fins de dia com cheiro a agosto pedem esplanadas e peixe, e esta família, desejosa de comemorar um acontecimento importante, rumou ao famoso Neptuno (depois de uma tampa de um restaurante baratucho). Quem não conhece este recanto plantado nas bordas do areal da Praia das Maçãs é porque não lê as crónicas de Miguel Esteves Cardoso.

Tenho de confessar aqui na minha barraca que ninguém me ouve. Por variadíssimas vezes o vi lá sentado, e de todas essas vezes o meu lado, como dizer isto isto...

Tímido/inseguro/envergonhado/enconado/ai jesus e se pareço estupida

impediu-me de o abordar. E isto perante uma pessoa que basta observar dois segundos para perceber que é afável, humilde e absurdamente simpático, atenção, não estamos a falar de um Lobo Antunes que, mesmo admirando muito como escritor, me levaria a fugir a sete pés com medo de ser odiada se o visse numa esplanada.

Isto é um absurdo, e é porque já se sabe que algures dentro de mim mora uma escritora que ainda não descobriu as portas de saída. Anda aqui a espreitar janelas, buracos e buraquinhos, mas a porta que é bom, nicles, não a vislumbro. E tenho, há muito tempo, esta vontade me sentar com um mestre como o grande MEC e perguntar-lhe: por favor, não se impressione com a minha pequenez, mas pode falar-me sobre isso de ser um (grande) escritor?

Falta-me lata, falta-me confiança, que isto a escrever é tudo muito bonito, mas quando me deparo com pessoas sem o meu escudo protetor que é a escrita, é ver-me toda encrencada a desejar fugir.

#éoqueé

Chegamos, então, à afamada esplanada - vazia. A única mesa ocupada era com o próprio do MEC. Controlo a invasão de ordens que começo a receber mentalmente, sentamo-nos ao sol, pedimos duas imperiais, brindamos a isto da vida e dos acasos bonitos e deixamos os nossos filhos serem infernais como habitualmente são,

OH MÃE ELE BATEU-ME

OH PAI OLHA ELE

OH FILHO NÃO SE LAMBE A GARRAFA DE AZEITE

OH MENINOS, VÃO BRINCAR PARA A AREIA E DEIXEM O PAI E A MÃE CONVERSAR

Sinto, às tantas, que se calhar estávamos a incomodar naquele ambiente suave e adulto da esplanada do Neptuno. Vale que o areal é tremendo e houve espaços aqui e ali de vago silêncio.

#subirdunas

#amonasnaareia

Acabamos de jantar, comandos internos aos gritos na minha cabeça e eu a ver a minha oportunidade fugir uma vez mais. Até que sou, subitamente, possuída por uma viking corajosa, avanço para a mesa do MEC e da sua mulher sem pensar, e digo

_ Vai-me desculpar.

SÓ ISTO. Não tinha preparado discurso, não sabia o que ia dizer, nada. Recebo de volta a resposta:

_ Não eu é que lhe peço desculpa, estávamos a observar-vos e é tão bonito ver um casal, assim, a olhar um para o outro. Principalmente com filhos, é tão raro ver, está tão certo. E os miúdos a serem miúdos, e os gelados antes do jantar, e as imperiais, e olhe, está tudo certo com vocês.

GELADO.JPG

(confere, foram todos lambuzados de gelado para o restaurante jantar)

 

Eu fiquei tão atrapalhada, tão sem jeito, tão... surpreendida com a grandeza e postura daquele senhor que, invariavelmente, nada de jeito me saiu. Mas já está prometida uma conversa porque diz-me o grande "conversar é tão bom", e eu, que sou pequenina, acredito piamente nele e quero muito saber TUDO sobre TUDO.

 

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